Pausa para um café – Que dia!

Esse vai ser um daqueles dias!

Isso é tudo que você consegue pensar. Basta uma pequena coisa dar errado, você não ter conseguido pegar o metrô no horário ou arrumado uma vaga para estacionar. O dia passou tão rápido que você nem percebeu e lamenta por não ter conseguido realizar tudo que havia planejado.

Ninguém responde suas mensagens, o café  e isso está te irritando está demorando muito e o atendente nem olha pra você. Enquanto você está quase arremessando o celular na mesa por que ele começou a travar uma mensagem aparece no visor: Reboot necessário. Atualização de sistemas.

Sem ter o que fazer, pois essa é uma regra universal tão imutável quanto a gravidade, você põe o celular de lado sobre a mesa. Então o mundo parece mudar à sua frente. As decorações natalinas do café te lembram que essa é a penúltima sexta-feira do ano e que as festas de fim de ano estão começando esse fim de semana agraciados por uma simples questão de calendários. “Nossa, 2018 passou rápido!!!”

Na messa ao seu lado você percebe que dois amigos estão discutindo animadamente entre argumentações históricas, religiosas, filosóficas e tecnológicas o que o futuro reserva para a humanidade e você não consegue ver a conclusão que irá sair dali.

Na mesa perto da janela uma jovem espera ansiosa por alguém e você não sabe que esse alguém nunca mais chegará a lugar algum. Uma pessoa sai correndo do café e grita pra alguém na calçada que retorna e lhe dá um abraço caloroso que você observa sem saber que eles não se veem há 20 anos. O seu café chega e o atendente te serve o último café que ele irá servir ali e mesmo sem você saber, ele está feliz, pois irá passar as festas com a família que está muito longe e o governo não concorda mais que ele esteja em seu país.

Essas situações começam a te fazer pensar sobre o que está acontecendo a sua volta, mesmo sem saber desses segredos todos que o destino nos priva de conhecer. São esses momentos de lapsos na nossa rotina que nos trazem para a realidade a nossa volta e nos faz perceber que um ano inteiro já passou e nós estamos prestes a perdê-lo pra sempre.

O garoto com uma camisa de Star Wars segura uma revista do Homem Aranha numa das mãos enquanto bebe o milkshake com a outra, uma metáfora te faz lembrar de tanta coisa que aconteceu ao longo desse ano, das poderosas franquias unidas sob um poderoso símbolo americano, mas também de todas as perdas que elas e todos os fãs sofreram.

O cinema do outro lado da rua te faz lembrar quantos filmes você deixou de assistir ao longo do ano, eram tantas coisas que você curtia, eram tantos ídolos de infância que ilustravam a sua imaginação e você nem os conhece mais, não são tão parecidos com os que você lembrava. Dizem que são outros tempos e você diz que é falta de respeito. Um garoto pergunta que símbolo é aquele no seu chaveiro, quando você responde que é de um personagem de quadrinhos e que você ganhou quando era criança ele diz: “Nãããooo! Não é assim o símbolo dele.”

Os dois amigos da mesa ao lado chegam a conclusão de que a humanidade é mesquinha demais, que só pensa nos seus interesses e não importa o quão ela esteja evoluída, vai sempre ter alguém preocupado com as sua prioridades. Você olha para o café que tanto esperou e percebe que ele já oxidou e está intragável, que ele não era tão importante assim. Você nota o celular e se pergunta por que tudo seu se restringia a ele, aos seus aplicativos, aos programas de gerenciamento que você instalou nele pra ajudar a gerir a sua vida e o seu trabalho.

O ano foi tão robótico que você não se lembra quando foi que saiu de casa só para andar, que na janela do seu quarto tem um ninho abandonado onde os filhotes já cresceram e você nunca ouviu um simples cantar, que 2018 foi embora e você nem o viu passar. Se estivesse mais atento teria visto o cortejo de caminhões de refrigerantes anunciando o período de festas que se iniciava passando pela sua rua, pela do seu trabalho, pela do café onde você para todos os dias.

O atendente vem te trazer uma água e pára no meio do caminho enquanto o âncora do jornal anuncia mais uma catástrofe, parece que não houve tempo de anúncios e você houve uma senhora se assustar e perguntar aos céus quantos mais ainda viriam esse ano. E você se perguntando por que ninguém respondias as suas mensagens. Quanta gente não vai poder responder.

O ano está acabando e ele não é feito de dias, horas ou minutos, ele é feito de pessoas que se cruzam com a sua vida a todo momento. Essa individualidade rege a sincronia do universo, faz as engenhosas engrenagens do tempo girar e nos coloca dentro dela, nos dá uma responsabilidade absurda que chega a ser petulância não querer fazer parte dela, de achar que uma simples mola, ou um dente da menor das engrenagens não fará falta.

Não somos os responsáveis pela nossa linha temporal, mas por todas as outras que nos conectamos inconscientemente, mesmo que como testemunhas de um diálogo na mesa ao lado, a tristeza de uma perda travestida de atraso, de um reencontro caloroso selado com um abraço que parece compensar todos os outros.

Não podemos dar um reboot no nosso ano, mas podemos reiniciar um novo, com novos conceitos, novos pontos de vistas e mesmo que essa linha de raciocínio não pareça coerente, que ela pelo menos tenha te tirado do “drive” e tenha te colocado em modo manual por um período curto.

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