As vezes a gente se sente muito cansado e percebe que já está velho demais pra essa guerra. Percebe que as cicatrizes já não te permitem mais àqueles exageros e as limitações impostas pelo tempo fazem doer na alma. Essa falta de flexibilidade juvenil acaba nos fazendo criar uma distância incompreendida em relação ao mundo exterior, algo natural pra ex-combatentes que já viu tantos horrores na vida, que se for enumerá-los torna inacreditável o relato.
Muitas vezes nos vemos travando essa batalha interior, abrimos um fresta na janela e escondido atrás das cortinas ficamos nos indagando sobre o mundo, tentando entender o que estão todos fazendo. Será que não percebem os sacrifícios que você fez até agora? E quando te veem te chamam de velho, ultrapassado, antiquado… É, o mundo era bem diferente no seu tempo, você viveu coisas que dariam medo nas espinhas deles, nem assim eles te deixam em paz.
A reclusão natural te faz travar lutas pessoais que não dizem respeito a ninguém. No distanciamento dessa civilidade que te rotula por não ser igual, mesmo sabendo que as diferenças deles se devem a sua desigualdade pessoal. Soldados não são aceitos na sociedade segura construída sobre os ossos de seus companheiros.
Num campo de batalha existem jovens, velhos, brancos, negros… quando a noiva fria varre o campo de batalha, ela não faz distinções, simplesmente lhe lança o seu olhar e abre os braços pra te receber. Quantas vezes o seu hálito frio beijou suas entranhas e quantas vezes depois você desejou que ela viesse logo?
Mesmo já tendo desistido de tudo e resolvido que o mundo deveria lidar com seus problemas por conta própria. Tudo que você quer é que te deixem em paz para viver os seus próprios demônios. Que deixem que você viva o seu “um dia de cada vez” sem que te lembrem das atrocidades que o mundo já fez com a sua vida. Que parem de dizer que você vive em um passado distante.
A vida é cruel por si mesma e tudo que você ainda deseja dela é uma estrada bem distante, uma campo verde e ter seus cavalos correndo por ele sem preocupações, sem a vida voltando constantemente para lhe cobrar aquele beijo frio que você deixou de receber e batendo no peito como se fosse graças a ela.
Mas ela aparece a sua porta sem avisar, para dizer que ainda existem soldados no campo de batalha, que são jovens e ainda possuem muito tempo e uma longa história à sua frente e você aceita mais uma missão. Você precisa retornar ao mundo vil, encarar os seus demônios e trazê-los pra casa.
A guerra vai sempre ser cruel, vai sempre te cobrar caro pelo que você faz, ela vai te bater, te esmurrar, te machucar até você não aguentar mais, então ela te joga um balde de água fria na cara pra te acordar e começar tudo de novo. Aqueles que estão lá, em meio a esse mundo já sem esperanças não entendem o que você está fazendo ali nem à eles, você praticamente têm de arrastá-los para fora do buraco para levá-los pra casa.
Você sempre soube que essas guerras não eram suas, não via motivos nelas mas aceitou de bom grado a missão. No campo de batalha não existem distinções, os mais fracos se mostram mais fortes, os inimigos se tornam aliados e a camaradagem acaba aflorando entre os distintos. Tudo se trata de sobrevivência, de acreditar nas promessas de que um dia estarão todos rindo e brindando em meio à um churrasco na casa de um ou de outro, nesse momento as disputas ficam em quem vai servir a bebida mais gelada ou a carne mais saborosa.
A incerteza do futuro ronda distante as fronteiras do acampamento e seus ocupantes não imaginam as desilusões que ela planeja para eles no futuro. Juramentos quebrados, dívidas de honra esquecidas, preceitos morais enterrados. No futuro a guerra pessoal impera, a sobrevivência individual se torna a mais importante da conquistas.
Mas a sua missão foi cumprida, você conseguiu mantê-los unidos e fortes, conseguiu dar alívio nos momentos mais difíceis, alertou sobre as armadilhas nos campos inimigos e todos comemoraram cada dia como se fosse o primeiro.
Muitos voltarão pra casa, outros ganharão o mundo… Os sons das hélices do resgate ecoam pela floresta e eles estão reagrupados, são seus os soldados, fortes e esperançosos pelo retorno aos seus lares. Lutaram uma boa batalha ao seu lado, mas o inimigo sempre esteve ao seu encalço e para que todos cheguem à segurança, sacrifícios precisam ser feitos, velhos e feridos atrasam o pelotão e se esperarem por você podem perder o seu momento.
O Sargento Elias nunca pôde ser resgatado…