À primeira vista você olha e fica com aquela cara de que não deve ser nada, talvez tenha sido essa a impressão que todos tiveram ao ver pela primeira vez 2001: Uma odisseia no Espaço, ambos trouxeram um contexto diferente para a sua época. Como no clássico filme de 1968, o público já acostumado com space operas repletos de ação brilhando na tela que não conseguia imaginar perder um tempo infindo com um monólogo espacial.
Mas em Final Space, que veio em um momento onde os canais de streaming sobrecarregam sua grade com animações nonsense, de traço extremamente caricatos e de fácil assimilação infantil, mas com textos e uma narrativas mais abrangente, muitas delas cheias e referências, essa ambientação colocou a série em uma zona de extremo perigo fazendo muita gente passar adiante nas listas de sugestões do canal, mas a animação persistiu bem, ao estilo do seu protagonista, sem esperar nada em troca e apenas te oferendo o que tinha de melhor.
Final Space é um space opera forçadamente de animação, por ser impossível de se imaginar como um live action, mas trazendo consigo tudo que os amantes da 7ª arte poderiam querer, cheio de referências aos clássicos de ficção científica, começando com o já mencionado clássico de Arthur C. Clark e indo aos cultuados Star Trek e Star Wars com muitos easter eggs para fazer os fãs chorarem.
Quando me refiro às referências não quero dizer um detalhe ou um diálogo, é com se você pegasse tudo de bom que já foi feito até agora no universo sci fi e colocasse tudo numa batedeira, os seus personagens e eventos favoritos invadem outros enredos também preferidos e se completam com uma maestria que só um louco sem precedentes como Gary poderia fazer.
As aventuras de Final Space seguem o seu protagonista Gary Goodspeed, um desses jovens com futuro perfeito que sofrem um trauma que o muda para uma vida toda tornando-se um ser banal, que tem sua vida transformada ao conhecer uma garota, mas seus atos inconsequentes o colocam em no momento e no lugar errado, e que suas decisões que quebram as barreiras da lógica deixam as tramas do destino emaranhadas a ponto de se tornarem imprevisíveis até para um viajante do tempo prever as variantes da sua própria linha temporal.
Os episódios são abertos sempre com uma cena de destruição final que nos leva a crer que será o fim da temporada, ao mesmo tempo que serve como uma contagem regressiva para a mesma. Essa contagem regressiva nos levam a conhecer o íntimo de Gary e nos coloca muito próximo do seu espírito amenizando o peso das cenas que viram a seguir. Da mesma maneira que conhecemos o personagem através dessa abertura passamos a torcer e gostar mais dele a cada vez que insanamente grava mais um vídeo com mensagens e um pouco mais de si para a sua amada.
Gary começa a série perdido no espaço nos últimos dias de sua sentença de 5 anos e tem como consciência e maior parceiro de diálogos a inteligência artificial de sua nave, H.U.E, uma referência direta e precisa à HAL 9000 enquanto o tom cômico é dado por KVN, que parece ter saído de uma fusão de um C3PO tagarela com um Marvin, porém bem humorado e otimista, que serviria como companhia em sua nave prisão. A nave está repleta de robôs automatas que serviriam para manutenção da nave, mas que vão desenvolvendo personalidades próprias à medida que o próprio Gary vai lhe dando nomes e características como parte do seu passatempo distracional.
A medida que os episódios avançam, vamos conhecendo os outros protagonistas que vão ajudar a construir a trama. Lord Commander é literalmente uma versão do Imperador Palpatine com um tom de humor logicamente ilógico e o maior vilão da aventura. Avogato é um de seus generais transformado em caçador de recompensas após começar a questionar os objetivos de seu superior e ter o seu filho como refém de Lord Commander, ele acaba se tornando um dos amigos mais leais de Gary.
A aparição de uma figura misteriosa que ajuda os não tão fugitivos de Lord Commander a se somar à caminhada paralela de Quinn Arigone, que desde o primeiro episódio traça a sua jornada numa autodescoberta para superar a decepção de toda a sua estrutura profissional e em colisão ao seu próprio futuro ao lado de Gary para vencer seus antigos aliados hoje corrompidos. Mooncake é o personagem mais distante do nosso universo que possui uma consciência infantil e ao mesmo tempo superior que constrói um laço de amizade com o protagonista da série.
Como pano de fundo da trama e o verdadeiro motivo do plano maligno a ser construído, temos uma abertura temporal ao velho estilo Tardis, que abre caminho para as criaturas antigas do outro universo na melhor característica Lovecraftiana, que estão prontas para invadir a terra sem mostrar o mínimo remorso ao passar por cima de seus sectos.
Mas Final Space não trata apenas de aventuras, tiros, mundos estranho e criaturas esquisitas, ela trata de amizade, confiança e responsabilidade em todos os níveis e preceitos. Que o motivo de estarmos aqui vai além dos nossos interesses pessoais ou o que traçamos como o correto para as nossas vidas; fala de dedicação, auto-descoberto, aceitação e entrega. A quebra dos preconceitos e paradigmas, nos faz crescer e nos tornar o que podemos de melhor de nós mesmos. Essas conquistas pessoais nos faz crescer aceitando que a perda e a solidão podem ser vitórias se as conseguimos para o bem do outro.
Nesse space opera construído por por Orlan Rogers, você não vai se ver apenas nesses mundo de blockbusters modernos, mas vai se sentir embriagado ao viajar por planetas e linhas temporais de clássico como Barbarella, Flash Gordon e Perry Rhodan. Apesar de ter sido pensado originalmente como uma webserie não deixou a desejar em nada desde a sua concepção original, já trazendo todo o conceito profundo e filosófico que o induziu a ser criado.
“Gary: Faltam dois minutos para os cockies ficarem prontos“… Afinal o seu tão esperado coockie pode não ser tão esplendoroso assim, mas é seu e o motivo de você ter resistido até aqui.